Cultura em Campinas: prelúdio dos lugares de resistência e vivência afro-brasileira
- Isabela Salgado
- 24 de out. de 2023
- 3 min de leitura
Atualizado: 19 de dez. de 2023
por Mapfumo Sondai Bakari

Vamos conhecer de África coisas,
caminhos, flores,
segredos, cores.
Quem é do axé
nesse batuque
não nega que é da terra, água e ar.
trecho do poema Candomblé, de Cyro Matos.
A história do Brasil foi calcada na prática de produção moderna bastante específica no trabalho, o escravismo moderno (Moura, 2020). Por cerca de quatro árduos séculos este modelo econômico e social vigorou em consenso com a expansão para o interior do território de posse portuguesa. Contudo, as pessoas vítimas da escravização contínua sempre se agruparam para fins de resistência à opressão nefasta que os europeus impunham em vários níveis da existência de sociedades inteiras - sejam por meio da espoliação material, territorial, familiar, comunitária; sejam pela desumanização e submissão naturalizada pelo intelecto dos colonizadores e colonialistas sobre os povos africanos; povos indígenas e povos afrodescendentes; sejam ainda pela profanação do sagrado dessas sociedades e das suas culturas e cosmovisões.
Nesse sentido, a ação de resistência tornou-se paulatinamente símbolo do direito das pessoas que descendem da diáspora africana forçada, a existirem e viverem enquanto sujeitos com história, tradição e ancestralidade. O modo de “ser e estar” que as pessoas da diáspora citada perpetuaram a conexão com o continente Mãe, formalizou-se enquanto base fundamental da cultura brasileira, por cultura compreendo como Asili, que por sua vez é,
“O logos de uma cultura (...) é a semente de desenvolvimento de uma cultura. É a essência cultural, o núcleo ideológico, a matriz de uma entidade cultural que deve ser identificada, a fim de fazer sentido das criações coletivas de seus membros.”
Aqui cabe dizer que os antepassados africanos e afrodescendentes nos construíram como cultura, política, espiritualidade e conhecimentos em vastos campos do saber. Então, aqui não reduzo os valores das culturas africanas presentes nesse território nomeado Brasil, aos estereótipos e fetiches de uma classe de pessoas privilegiadas pelo trabalho escravista dos seus ancestrais.
Portanto, o que se propõe aqui nesse texto e nos demais é passear pelos lugares históricos de conhecimento, ancestralidade, sabedoria e ciência, afro brasileiros, especificamente no município de Campinas. Tendo em vista que a cidade alçada como a segunda metrópole de São Paulo têm como histórico ser a última cidade no Brasil a abolir a escravidão. Assim, a carga que este território carregada no que toca a violências sobre pessoas não-brancas é altamente relevante. Então a proposta da série de textos que virão é passear pelos centros históricos de resistência na cidade, bem como conhecer e descrever os lugares que fomentam a cultura afro brasileira, seja nas Artes; seja na Educação popular; seja no Acolhimento aos corpos desassistidos pelo Estado; seja na Sabedoria Ancestral e Espiritual; ou ainda na consolidação de pesquisa etnográficas culturais. Nesse aspecto, referencio lugares na cidade de Campinas, como: a Casa de Cultura Tainã; o Instituto Baobá de Cultura e Arte; Casa de Cultura da Fazenda Roseira; Clube Machadinho; Casa Grande e Tulha, entre outros espaços.
Se a história brasileira foi calcada no escravismo e no roubo por parte dos europeus, e posteriormente a elite econômica branca, cujo o programa político hegemônico - ou seja, programa pensado e aplicado pelos impérios colonizadores e pelos colonialistas - continua em estado de beligerância com as populações não-hegemônicas, digo às populações negras; as populações indígenas; as populações quilombolas, entre outras. Então também cabe pontuar que a história brasileira foi também base de continuidade histórica, espiritual, cultural, corporificada em cada pessoa negra; afro indígena que caminha por aqui até hoje. Desse modo, a população negra e indígena desse país, que em percentuais são a maioria da população - 55,9% de acordo com IBGE em 2022 - mesmo que com muitos reveses mantém a luta histórica em todos os lugares do território, buscam e lutam pela manutenção do direito de viver plenamente, em consonância com seu berço cultural. De outro modo, posso escrever que como Amílcar Cabral nos ensinou, queremos “preservar e criar cultura para fazer história” (A. Cabral apud Nascimento, 2019, p.65)
Referências consultadas para redação
Livro Yurugu - Marimba Ani: Marimba Ani — Yurugu — Uma Crítica Africano-Centrada do Pensamento e Comportamento Cultural Europeus | Esta Hora Real
Moura, Clóvis. Quilombos: resistência ao escravismo. 1. ed - São Paulo: Expressão Popular, 2020. 136 p.
Nascimento, Abdias. O quilombismo: documento de uma militância pan-africanista; com prefácio de Kabengele Munanga; e texto de Elisa Larkin Nascimento e Valdir Nascimento.-- 3.ed.rev.-- São Paulo:Editora Perspectiva; Rio de Janeiro: Ipeafro, 2019.
Censo IBGE sobre Etnia: https://educa.ibge.gov.br/jovens/conheca-o-brasil/populacao/18319-cor-ou-raca.html
Mattos, Cyro de. Poemas de terreiro e orixás - Belo Horizonte: Mazza edições, 2019. p,20.
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